domingo, 30 de outubro de 2016

Conto- Sementes E Frutos

Eric do Vale

“Sonho que se sonha só
É só um sonho que se sonha só
Mas sonho que se sonha junto é realidade”
(Preludio: Raul Seixas)


Aquelas palavras nunca saíram do pensamento “Você tem que visualizar as suas conquistas. E não apenas isso, deve também deve sentir-se como se já tivesse conquistado.”. Por isso, imaginou que aquele modesto quarto de estudo como um prospero consultório médico ou um respectivo escritório de advocacia.
Sempre que ia para a faculdade, imaginava-se trajando uma roupa branca, ou um terno e gravata, segurando uma pasta de couro, ou uma valise, em direção a uma consulta ou audiência.
Dentro do seu escritório, ou consultório, lembra-se daqueles tempos de estudante; o consultório, ou escritório, no quarto de estudos de outrora. Nas consultas, ou audiências, que, hoje, fazem parte de sua rotina recorda-se, com frequência, daqueles dias em que ia para a faculdade na busca de suas realizações.
E aquelas palavras... O que mais lhe confortava era saber não havia mais precisão de visualizar as suas conquistas e, muito menos, senti-las como se já tivesse alcançado tais objetivos, porque tudo, agora, estava sendo vivenciado.

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Conto- Maus Bocados

Eric do Vale

Ninguém perguntou nada, quando a viram chegando de mala e cuia, mas todos, daquela cidade, sabiam que alguma coisa tinha acontecido. Uma mulher como ela poderia ter o homem que quisesse, mas preferiu entregar-se justamente aquele sujeito. Meses depois, eles haviam se casado até evaporarem.
Descobriu-se, pouco tempo depois, que aquele homem, assim como os familiares dele eram procurados pela polícia, em virtude de vários golpes. O que ela viu naquele sujeito? Essa era a pergunta que todos os habitantes daquela cidade faziam. 
Durante três anos, ela comeu o pão que o diabo amassou. Se conviver com o marido já era um inferno, com os sogros então... Ainda mais que esses dois eram a personificação do demônio.
Há quem fale que ela sofreu cárcere privado e, várias vezes, alguém tinha que avisá-la que a sogra estava chegando para ter tempo de trancar-se no quarto, porque essa queria assassiná-la.  Aquele pessoal teve a proeza de surrupiar todas as economias que ela havia juntado, depois de muito trabalho.
Lá estava ela, com a mão na frente e a outra atrás, e longe de ser aquela mulher esfuziante de outrora caminhando, com um olhar vago, em direção a casa dos pais, onde nunca deveria ter saído. 
-Como vai o seu marido? _ Perguntou alguém que a viu. 
-Morreu. _ Respondeu secamente.
-Eu sinto muito!
Ela não deu importância e ao e pensou: “Morreram todos, para mim”.

segunda-feira, 24 de outubro de 2016

Poesia- Um Dia

Eric do Vale

Se não for Vai ser
Se não foi hoje
Amanhã, talvez,
Outro dia, quem sabe
Aqui estamos
E por aí nós vamos.


Conto- Elas E Eu

Eric do Vale

A minha mulher me mataria, pois associaria o nome dela a outra e o que é que eu iria dizer? Certamente, falaria:
-Amor, não é essa... Tem uma outra da chamada...
Então, eu me complicaria todo.
Sou adepto da ideia de que há coisas que nunca devem ser ditas, nem mesmo para um padre, durante a confissão, e a um analista, no meio de uma sessão.
Fico só me imaginando deitado em um divã dizendo: "Doutor, eu não sei o que há comigo, mas, de uns tempos pra cá, percebi que não posso conhecer nenhuma mulher com esse nome...".
A primeira... Ah, a primeira!  Quando me lembro dela, associo a nossa história a uma sinopse de novela. Por que acabou?  Sempre que me faço essa pergunta, tenho vontade de voltar no tempo e concertar toda a burrada que fiz.
A número dois, não sei o que foi que aconteceu. Ainda hoje, eu me pergunto: “Por que parou? Parou por quê?”. Eu a quis e ela bem sabe disso. Agora, é a terceira, fora uma outra...Além do nome, elas são iguais em tudo: beleza, personalidade e possuem muito fogo. Não sei o que faço! Por que eu? Por que elas?


Conto- Viagem

Eric do Vale


a)      A Ida

Chamava-me a atenção o andar daquele homem:  era todo desengonçado; parecia que iria cair no chão. Ele continuou cambaleando até pegar um pedaço de pau e jogá-lo na janela do ônibus, onde eu estava.
- Ainda bem que não era uma pedra, porque quebraria o vidro _ Comentou um passageiro. 
Quando isso aconteceu, o ônibus já estava em movimento.
A minha prima, que me acompanhou nessa viagem, falou, assim que chegamos, para uns parentes nossos sobre um homem que entrou no ônibus, onde estávamos, dizendo-se padecer de problemas mentais e depois, quis arranjar briga com os passageiros.
Impaciente, o motorista, ajudado por dois passageiros, colocaram- no para fora do ônibus. 
-Ele saiu todo desequilibrado, pegou um pedaço de pau e atirou contra a janela do ônibus. _ Falou a minha prima.
Até hoje, eu não entendo como não fiquei a par do que estava acontecendo a minha volta.





b)     A Volta

Se não me engano, fazia uma hora que estávamos na estrada, quando um homem começou a falar muito alto. Percebia-se que ele estava bastante alterado e falava frases desconexas. 
Naquele momento, o rádio, estava ligado e tocava aquela música Vou de Táxi.
-Desliga essa... senão, eu vou quebrar... _   Gritou esse homem, conforme ia falando os mais variados palavrões.
O motorista, naquelas condições, desligou o rádio. Mesmo assim, ele não cessou com os xingamentos;
De repente, o ônibus parou para receber os passageiros de um outro ônibus que havia quebrado, conforme vim saber, tempos depois, pelo meu pai:
-Quando eu vi aquele povo chegando, estava vendo a hora daquele cara surtar de vez. _ Disse o meu pai para um conhecido dele.

A viagem prosseguiu e apesar de me sentir cansado e tenebrosos com a fúria daquele homem, servia-me de consolo saber que, logo mais, eu estaria em casa dormindo na minha cama. 

terça-feira, 18 de outubro de 2016

Poesia- Tudo E Nada

Eric do Vale


Tudo é tudo
E nada é nada
Ou, quem sabe,
Tudo e nada
E nada é tudo.
Uma vez que
Do nada
Nasci tudo
E do tudo
Se reduz a nada.


domingo, 16 de outubro de 2016

Poesia- O Inexplicável

Eric do Vale


Explicar
O inexplicável
Aquilo
Que
Não
Tem
A
 Menor  
Explicação,
Tonando-se
Impossível
De
Se
Chegar
A
Uma
Conclusão. 

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Conto- De Algum Lugar Para Algum Lugar

Eric do Vale


“Eu já estou com o pé nessa estrada
Qualquer dia a gente se vê
Sei que nada será como antes, amanhã”
(Nada Será Como Antes: Milton Nascimento& Ronaldo Bastos)


Aquele mês de janeiro, significava para mim, em todos os sentidos, o surgimento de um ano novo. O que, antes, era encarado como um martírio, significava, agora, um ato meramente burocrático.
Por que tinha que me preocupar com aquilo? Levando-se em consideração que eu já havia sido aprovado no vestibular, inexistia qualquer motivo para, naquele momento, me preocupar se passei de ano, ou não.
Assim que peguei o meu boletim, alguém tocou no meu ombro. Era um colega meu de classe.
-Vim pegar o meu boletim. _ Disse ele.
-Eu também.
-Passei.
-Passamos.
-Graças a Deus! Acredito que ninguém, da nossa sala, ficou reprovado.
- Também acho.
Conversamos bastante, à medida que fomos caminhando pelas galerias do colégio. Não me lembro ao certo sobre o que dialogamos, mas, se não me falha a memória, falamos sobre muita coisa referente ao passado, presente e futuro.
O que me chamou a atenção, naquele instante, foi ver os corredores vazios e observar o silêncio absoluto que reinava naquela escola.   Mas, eu sabia que, dentro em breve, tudo aquilo voltaria ao normal. Minto, nem tudo...
Dirigimo-nos até a recepção e ao atravessarmos aquele portão de ferro, ele falou:
-Entramos juntos e juntos sairemos.
Ele tinha toda razão em dizer aquilo.
Uma sensação de alivio, liberdade, dever cumprido e saudade mesclaram-se, quando deixamos aquele espaço.
 Não me lembro se chegamos a nos despedir e prefiro acreditar que isso sequer tenha acontecido, melhor assim. Lembro-me apenas que cada um, naquele momento, tomou uma direção e seguiu o seu rumo. 



terça-feira, 11 de outubro de 2016

Conto- O Aviãozinho De Papel

Eric do Vale

Para Lívio de Carvalho Coelho Chagas

No primeiro ano, do Ensino Médio, tínhamos um professor de física cujas aulas dele eram inesquecíveis Não que ele fosse o as dessa matéria, nada disso; o que tinha de bom na física, era uma negação na língua portuguesa:
-Vou dar um ixemplo pra vocês. _   Dizia ele.
A priori, pensava que essas gafes que ele cometia na língua portuguesa era passava um chiste dele, mas não era.
Certa vez, ele falou:
-Quando o movimento é pusitivo, ele sobe. Do contrário, ele desce para baixo.
Um dia, esse professor escreveu a palavra trem, no quadro, corretamente e alguém falou:
-Professor, tem termina com N.
Ele, então, apagou   a letra M e acrescentou o N.   
Quando ele se invocava... Na hora de excluir um aluno de sala:
-Pa fora! Eu avisei, eu avisei, eu avisei!
Esse professor cismou com um colega nosso e com toda razão: além de repetente, ele fazia mil e uma artimanhas na aula dele. Se já era engraçado vê-lo colocando um aluno para fora de sala, tornava-se mais cômico quando era esse nosso colega:
-Oh, tu! Pa fora!
-Não, por favor! Por favor!
-Eu avisei, eu avisei, eu avisei!
-Por favor!
Um dia, esse professor estava corrigindo as nossas provas e passou um exercício para resolvermos. Além de não termos feito coisa nenhuma, fizemos uma guerra com as bolinhas de papel.
Eu fiz um aviãozinho de papel e inventei de jogá-lo em um colega meu. Contudo, a porcaria do avião mudou a trajetória e pegou justamente no rosto do professor. Pensei: “Danou-se!”.
O professor levantou-se e falou:
-Eu vi, foi tu! _ Apontando o dedo. Para mim. - Pa fora!
Eu já ia fazendo isso, quando escutei aquela gritaria:
-Não fui eu! Não fui eu! Eu juro!
Era aquele cara que o professor tinha marcação.
-Eu avisei, eu avisei, eu avisei! _ Falou o professor.
-Mas, não fui eu! _ Gritou ele.
-Foi sim.
-Não fui eu nada!
-Foi você, sim. Eu vi.
 No mesmo instante em que joguei o avião, ele tinha atirado uma bolinha de papel em não sei quem Logo, o professor pensou que tivesse sido ele.
-Professor, fui eu_ Falei.
-Nada disso, foi ele.
Restou-me, então, ir até a coordenação, confessar tudo e livrar a cara desse meu colega. 
-Ele não jogou o avião no professor, fui eu. Mas, uma coisa eu te garanto: foi sem querer. _ Eu disse.
-Você? _Indagou o coordenador. – Meu camarada, como é que você faz uma coisa dessa? Justo você! Mesmo assim, terei que punir o seu colega, em virtude do histórico dele.
  

Conto- O Misantropo

Eric do Vale


Ouvi, pelo rádio, alguma coisa relacionada ao caso Champinha e me lembrei de que, dias antes, conversei com um ex-colega de escola sobre um cara que estudou conosco.
-Aquele cara me dava arrepios! _ Disse esse meu colega.
Não levei muito a sério o comentário dele e continuou:
-Ele era a única pessoa, daquela nossa sala, que eu, realmente, tinha medo. E se, hoje, o encontrasse na rua... Sairia correndo.
Percebi que esse meu colega não estava brincando, porque era a primeira vez, em todos esses anos, que eu o ouvia falar daquele jeito.  
Ao vê-lo folheando uma revista, durante a aula, o professor falou:
-Amiguinho, pode ler esta sua revista lá fora, por favor? 
Ele levantou-se, pegou as suas coisas e quando saiu, bateu a porta com toda força. Uma colega nossa, naquele momento, falou:
-Professor, não acha que está sendo injusto? Ele não estava incomodando ninguém.
-Durante as minhas aulas, eu quero que todos estejam atentos.
Duas semanas depois, estávamos fazendo prova, quando esse cara levantou-se. Já de saída, bateu a porta com tanta força; Muitos de nós ficamos perplexos com aquela atitude, mas não dissemos nada até que alguém manifestou-se:
-Filho da...  
Esse meu colega falou-me de um fato ao qual, até então, eu desconhecia:
-Um dia, o professor entregou as nossas provas de redação; o Jorginho e eu vimos o momento em que esse cara amassou a prova e, com toda veemência, atirou no cesto de lixo. Ficamos sem entender direito e no final da aula, pegamos, discretamente, a redação dele. O professor havia dado zero, porque ele tinha fugido do tema. E quando fomos ler... A redação dele narrava a história de um casal que estava discutindo; o marido ficou tão chateado, que saiu de casa e ao ver um gato passando pela rua, resolveu degolá-lo. 
Assim que me viu boquiaberto, esse meu colega falou:
-Foi assim que o Jorginho e eu ficamos, quando lemos essa redação dele.













domingo, 9 de outubro de 2016

Conto- A Busca

Eric do Vale

          Uma famosa atriz suicidou-se, atirando-se de um prédio. Pelo que me lembro, conforme informou o apresentador do telejornal, ela havia trabalhado em duas produções: As Panteras e Charada Em Veneza. Nunca me esqueci desse acontecimento, porque era a primeira vez, na vida, que escutei o verbo suicidar, assim como o seu significado. 
            Alguns anos depois, lembrei-me desse fato, quando assisti pela televisão, um episódio das Panteras. Qual delas havia dado cabo na própria vida? Não faço a menor ideia.
Tal lembrança permaneceu armazenada na minha memória, por muito tempo, até que, um dia, assobiei, sem mais nem menos, o tema de abertura desse seriado, no meio do expediente. Logo, decidi acessar o Google e assim, desvendar esse mistério.
A vantagem de viver nos dia atuais é que temos a Internet a nossa disposição, a todo o instante, para tirarmos as nossas dúvidas sobre qualquer assunto. Pelo que pude apurar, as atrizes que fizeram parte das Panteras, até o presente momento encontram-se vivas.
Acordei, no meio da noite, e perdi o sono sem nenhuma razão. Naveguei um pouco pela internet até que me veio o nome do filme Charada Em Veneza. Acessei o Google e pesquisei o nome das atrizes que atuaram nesse filme e então, Eureca!
Ela era francesa e iniciou a carreira como modelo até tornar-se atriz. Dentre os filmes que atuou, está A Pantera Cor De Rosa. Na infância, eu sempre me confundia com o filme e o desenho animado homônimo, juntamente com o seriado As Panteras.
Depois de fazer muito sucesso, a careira dela entrou em declínio. Consequentemente, ela passou a sofrer de depressão e após várias tentativas de suicídio, terminou alcançando tal objetivo atirando-se do oitavo andar do apartamento, onde residia 

Conto- Consciência

Eric do Vale


Será que me descobriram? Não sei. Ninguém, até agora, falou nada, por isso estou na minha e quero continuar assim. Desde ontem venho sendo tratado com frieza. Isso nunca tinha acontecido, antes! 
Como fui cair em tentação?  Certamente, devem ter me dedurado. Por que fui fazer aquilo? Não adianta me martirizar; a besteira já foi feita, mas nunca poderia imaginar que eu fosse cair tão rápido. 
Nunca fui disso e não faço ideia do motivo que me levou a fazer o que fiz. Aquilo foi uma fraqueza, é claro.  Justo eu, que sempre prezei pela ética! Como fui cair nessa? Cada vez que me faço essa pergunta, penso: "A casa caiu".
Agora, não sei o que fazer. Talvez, não seja nada disso e, quem sabe, posso até ter me equivocado. Mesmo assim, acho estranho e, até agora, estou com a pulga atrás da orelha. Será que alguém me entregou? Será que me viram?




Conto- A Escolha

 Eric do Vale 

Para Natalina Philomena Assumpta Odísio de Sá & André Pontes Thé


Com onze anos de idade, eu já tinha uma certa noção do que queria da vida: tornar-me engenheiro. Manifestei esse desejo em uma reunião de família e uma tia minha falou:
-Engenheiro? Você não tem a menor vocação para isso.
A franqueza sempre foi um traço peculiar na personalidade dela, sendo essa uma faca de dois gumes: defeito para uns; virtude para outros. Confesso que, naquele momento, eu fiquei completamente sem ação e ela prosseguiu:
- Por que não pensa em estudar Direito? Tenho certeza de que você será um excelente advogado.
Não dei importância ao comentário dela.
A encontrei em casa, meses depois, quando voltei do colégio e mostrei-lhe a nota que eu havia tirado na prova de matemática: 9,0.
Depois de ser parabenizado, falei:
- Serei engenheiro. _ Falei.
-Engenheiro? Por que não cursa Direito? Tenho certeza de que você será um excelente advogado. Sabia que Getúlio Vargas foi advogado? 
-O Juscelino também era advogado? 
-Não, ele era médico
Ela finalizou:
-Faça Direito.
Tal história repetiu-se, muitos anos depois, quando um colega meu de escola, no meio de uma conversa informal, perguntou:
-Nunca pensou em fazer Direito e ser advogado? 
-Por que está me dizendo isso? 
-Porque acho que você tem tino para essa profissão.
Ele tornou a me dizer isso, dois anos depois, quando estávamos na época de fazer vestibular.
Nunca, em toda a minha existência, pensei em cursar Direito e, respectivamente, tornar-me advogado, conforme a minha tia e esse meu amigo haviam me aconselhado. Também, não consigo entender de onde tirei a ideia de querer ser engenheiro, visto que cálculo nunca foi o meu forte.
A única coisa que sei é que após vários impropérios, encontro-me, atualmente, na metade do curso de Direito   visando, futuramente, tornar-me um advogado.

Conto- Ironia Do Destino

Eric do Vale


Não sou criminalista, mas peguei esta causa atendendo a um pedido de um colega meu, porque esse encontrava-se atuando em um outro processo. 
Na proporção em que fui estudando o caso,  lembrei- me dos meus tempos de universitário, durante a aula de Direito Penal.
-Acusar alguém de assédio sexual é algo muito grave. _ Falou o professor daquela disciplina.
A minha cliente tinha uns vinte e poucos anos e alegava ser assediada sexualmente pelo seu chefe. Com frequência, ele enviava mensagens com cantadas típicas de um cafajeste, conforme pude averiguar. 
Ela havia me dito que outras funcionárias também foram assediadas por ele; uma delas até chegou a ser demitida por justa causa, porque ameaçou de denunciá-lo a polícia.
Durante a audiência, lembrei- me das palavras do meu professor de Direito Penal: "Acusar alguém de assédio sexual é muito grave. Podendo, muitas vezes, destruir a reputação do réu ". Pensei muito nisso, quando o vi naquelas circunstâncias. Justo ele, um homem casado e pai de família! E o que mais me impressionava era saber que, em um período distante, fomos colegas de escola. 

A lembrança que eu tinha dele, naquela época, era que ele sempre foi um aproveitador, em todos os sentidos. Se eu fosse uma pessoa sádica, poderia ter me alegrado vendo- o naquela situação constrangedora, visto que quem estava defendendo a vítima dele era justamente alguém que ele sempre subestimou.

Conto- Tempo Real

Eric do Vale


Eu estava com a cabeça repleta de preocupações, quando a avistei do outro lado da calçada. Reconheço que fui o grande responsável pelo nosso distanciamento; depois disso, chegamos a nos encontrar meio que casualmente; mas o nosso contato, como era de se esperar, passou a ser bastante formal.
Ao ser notado por ela, atravessei a calçada e perguntei:
-O que está fazendo?
- Eu vou...                                                                         
-Posso te acompanhar?
-Sim.
Trocamos menos do que três palavras e quando atravessamos o primeiro quarteirão, deixamos de lado odos os nossos afazeres. O cheiro dela permaneceu na minha pele, assim como o gosto do batom que, por um longo período, ficou na minha boca.
Custei a acreditar no que tinha acontecido, instantes atrás. Estou certo de que ela, assim como eu, ficou sem entender coisa alguma. Gostaria de saber o que deve ter passado pela cabeça dela, durante e depois daquele ocorrido.

Conto- Reflexão

Eric do Vale

Por que me tornei policial? Os filmes que eu assistia, certamente, me influenciaram a seguir essa carreira. Ficava me imaginando, um dia, prendendo um bandido e dizendo: "Você tem o direito de permanecer calado e tudo o que disser será usado contra você no tribunal ".  Charles Bronson e Clint Eastwood eram meus heróis de infância. 
Quando assisti Tropa de Elite, resolvi, naquele momento, entrar para a polícia militar e foi o que aconteceu. Eu sabia que a realidade era diferente do que ocorria nas telas e pude constatar isso, durante as diligências. 
A minha admiração por aquele trabalho somava-se ao espírito aventureiro. No entanto, aquilo foi me cansado. Além de bastante puxado, aquele oficio foi ficando bastante perigoso. Perdi a conta de quantos amigos morreram no cumprimento do dever.
Depois de oito anos na PM, prestei concurso na policia Civil e fui aprovado. Nesse mesmo período, cursei a faculdade de Direito com a finalidade de, futuramente, tornar-me delegado. E foi o que aconteceu.
A adrenalina sempre foi algo que fez parte da minha personalidade, mas, hoje, quando cheguei em casa, lembrei-me das palavras do personagem do Sean Connery fala para Kevin Costner, no filme Os Intocáveis: “Você cumpriu a lição número 1 de um policial: voltar vivo”. Penso nessa frase, na proporção que me lembro de que, dentro em breve, serei pai.


sábado, 8 de outubro de 2016

Conto- Em Apuros

Eric do Vale



Ao meu lado, sentava-se um homem que, o tempo todo, dizia achar estranho a rota daquele nosso voo, pois, sendo biólogo, viajava com frequência para aquela região. Eu, no entanto, não prestei muita atenção no que ele falava, porque, naquele momento, estava pensando em uma outra coisa: “Tudo ficará esclarecido. Na condição de advogado, vou me valer dos bons antecedentes apresentados pelo meu cliente.”.
O biólogo tornou a dizer que havia alguma coisa de errado naquele percurso. Continuei ignorando o comentário dele, assim como as demais pessoas presentes, naquele voo. Minutos depois, fomos informados de que o avião encontrava-se fora ao rota prevista.
- Não falei? Eu sabia, eu sabia! _ Pronunciou o biólogo, falando alto.  
A aeromoça tentou acalmá-lo alegando que tudo estava sob controle. Ela utilizou esse mesmo argumento, quando, depois de alguns segundos, ficamos sabendo que o avião tinha sofrido uma pane. O comandante, naquele momento, fez o seguinte comunicado:
-Senhores passageiros, mantenham as poltronas inclinadas, porque vamos fazer um pouso de emergência.
...

 Depois que encontrou, pela internet, o caminhão que desejava adquirir, Ananias fez a aquisição do veículo, contudo o vendedor não informou em qual agência bancária deveria ser feito deposito do dinheiro e sequer entrou em contato com o comprador para que ficasse acordada a entrega do caminhão. Por isso, Ananias resolveu procurá-lo.
 Além do nome, ele sabia que o respectivo vendedor residia em uma fazenda, no interior do Pará. Ananias pediu informações ao gerente do hotel, onde estava hospedado, sobre uma cidadezinha do interior daquele Estado e esse lhe falou:
- É muito longe daqui, doutor.
-Amanhã, precisarei ir até lá e pelo que verifiquei, o local fica bem aqui
. _ Mostrando-lhe o mapa.
-Doutor, o senhor tem certeza de que é nessa cidade?
-Sim.
O gerente saiu, chamou dois funcionários do hotel e depois, falou:  
-Pelo jeito, o senhor não é daqui.
-Não.
-Veio a negócios, certo?
-Isso mesmo.
- Logo vi.
-Querem me explicar, por favor, o que está acontecendo?
-É simples: esse lugar para onde o senhor está querendo ir é totalmente isolado. Acho que não preciso dizer mais nada.
Ananias contrariou os conselhos dos funcionários do hotel, alugou um carro e, no dia seguinte, seguiu viagem. No meio do trajeto, foi parado por uma blitz. Quando viu aquela mala cheia de dinheiro, o policial achou muito estranho e pediu-lhe explicações.
Os argumentos de Ananias não foram muito convincentes, por isso terminou sendo detido.
                                                                ...
Estou vivo? O tempo todo, me fiz essa pergunta; principalmente, depois da queda do avião. Mas, somente agora, dois dias depois de ser resgato, tenho absoluta certeza disso.      
Passado todo o susto, após o pouso forçado, a primeira coisa que todos nós pensamos em fazer, foi ligar para os nossos familiares avisando sobre o que tinha acabado de acontecer e garantir-lhes que estava tudo bem.
Além de nos encontrarmos em um local bastante ermo, a maioria dos aparelhos eletrônicos haviam sido danificado, em virtude do impacto causado pela queda. Dessa forma, tornou-se impossível acessar a internet o dar algum telefonema.
O meu cliente, nessa altura do campeonato, deve estar subindo pelas paredes. Preciso entrar em contato com ele o mais depressa possível! Assim como eu não gostaria de estar na pele dele, tenho certeza de que, quando souber o que aconteceu comigo, o Ananias desejará o mesmo.