Era um advogado
atuando ou um ator advogando? O tempo todo me fiz essa pergunta, quando o vi
entrar em cena e magnetizar a plateia daquele tribunal com a sua retórica e os
seus olhos verdes. Mesmo beirando meio século de vida, conservava certo valor
estético. Havíamos, diversas vezes, nos encontrado pelos corredores do fórum,
mas não me lembro de termos trocado algum comprimento. Creio que isso nunca
aconteceu e tinha a convicção de conhecê-lo de algum lugar, mas de onde? Da
faculdade não poderia ser e do colégio, tão pouco. Ele era muito mais velho do
que eu. Um dia, quando vi, perguntei a um colega meu:
-Quem é ele?
-Você não sabe? É o
doutor Luís.
-Luís de quê?
- Luís Varela.
O nome não me ajudou
muito, por isso acessei o Google e descobri que era um
advogado muito conceituado com mais de dez anos de atuação, porém aquilo para
mim não era o suficiente. Esse também era o nome de um famoso ator do qual eu
tinha uma vaga lembrança. Considerado um galã da sua época, Luís Varela fazia
sucesso no teatro, cinema, televisão e, especialmente, com as mulheres. Era de
dar inveja a qualquer D. Juan. Eu tinha uma prima que era apaixonada por ele e
dizia aos quatro ventos que, um dia, se tornaria esposa dele e de mais ninguém.
Atualmente, essa minha prima encontra-se na sua terceira relação conjugal. Como
a minha mãe é uma noveleira de carteirinha, perguntei se ela se lembrava desse
ator, que me respondeu:
-Claro, ele tinha uns
olhos verdes e era muito bonito! Nunca mais ele fez novela, não sei por quê?
Ele era muito talentoso!
Muito se especulou
sobre isso, houve quem dissesse que ele estava com síndrome do pânico ou
depressão. Acreditou-se até que já estivesse morto, há bastante tempo. A minha
prima que diga, assim que perguntei se ela se lembrava dele, ouvi a seguinte
resposta:
-Esse cara já não
deve nem mais ter osso.
Um jornal, certa vez,
noticiou que ele havia cometido suicídio, ao descobrir que era portador de uma
doença terminal. Luís Varela, então, divulgou uma nota desmentindo o boato e
falou que estava, atualmente, vivendo no Mato Grosso e a sua saúde, assim como
a sua vida, “iam muito bem, obrigado”. O que leva alguém, de uma hora para
outra, a abandonar uma ascendente carreira artística, a ponto de se estabelecer
nesse confim de mundo? Impossível de compreender, na mesma proporção que se
torna curioso.
Agora, estávamos ali,
naquele tribunal, e em lados opostos apresentando os nossos pontos de vista.
Não era de hoje que eu já tinha ouvido falar dos feitos de Luís Varela no campo
jurídico. Quando peguei a causa, logo fui informado de que ele seria o meu
oponente: Os meus colegas não perderam a oportunidade para me advertirem:
-Você vai enfrentar
uma parada dura. Acho bom se preparar.
Tão certo como dois
mais dois são quatro, mas eu não deixei me intimidar. Pode-se dizer que foi uma
briga de titãs tal e qual Mike Tyson e Evander Holyfield até que as duas partes
resolveram entrar em um consenso. Foi melhor assim. Logo que o juiz bateu o
martelo, dirigi-me até Luís Varela e lhe dei a mão, parabenizando pelo êxito.
Esse, por sua vez, retribuiu e me perguntou:
-O que vai fazer,
agora?
-Agora?
-Sim, gostaria de
saber se, por acaso, você está com o tempo livre?
-Estou sim, por quê?
-Gostaria de lhe
pagar um drink, você aceita?