quinta-feira, 16 de maio de 2013

Conto - Sem Sentido



                                                                                         Eric do Vale


Trajada de negro e com as orelhas sortidas de alfinetes, ao meu encontro, aquela figura veio, quando eu me direcionava rumo ao ponto de ônibus. Embora ele me parecesse familiar, optei em não encará-lo, porque receei de que pensasse que eu estivesse fazendo caso de sua esdrúxula aparência. Certifiquei-me de que estava certo, quando ele mencionou o meu nome e perguntou:
-Não se lembra de mim?

Antes que eu me manifestasse, ele identificou-se e tamanha foi a minha surpresa, que, por meio de um dialogo, dissimulei:
-Quanto tempo! E aí, o que você está fazendo da vida?
-Artes plásticas.
-Sério? Lembro que você desenhava bem pra caramba!
-E você, continua escrevendo?
-Agora, mais do que nunca. Sou graduado em jornalismo.

Não estou bem certo se a conversa teve prosseguimento, mas recordo-me de que segui o meu caminho, após nos despedimos, em direção a parada, onde aguardei o ônibus extasiado: “Deixa o pessoal saber disso! Ninguém vai acreditar, mesmo assim eles precisam saber!”.

Ele jamais havia dirigido uma palavra a mim e aos demais colegas de classe no período em que estudamos juntos. Durante dois anos, ninguém nunca o ouviu desejar “Bom dia!” ou responder “Presente” na hora da chamada. Sentava-se próximo a porta, encostado na parede, e não se levantava para nada. Comumente, folheava uma revista em quadrinhos ou passava o tempo desenhando qualquer coisa. Enquanto confabulávamos na hora do intervalo, ele mantinha-se alheio a tudo e a todos.  Tentamos fazê-lo entrosar-se conosco, porém a sua recalcitrância superava as nossas boas intenções.
Fomos, um dia, requisitados a ficarmos de pé, para cantar o Hino Nacional. 
Sentado ele estava e sentado permaneceu até o fim da solenidade. Visando repreendê-lo, o professor questionou:
-Por que você não se levantou? Você não é brasileiro?
 A sua resposta, como de praxe, foi o seu silêncio.

No ultimo ano letivo, alguém suscitou a possibilidade de ele tornar-se o orador de nossa formatura. É obvio que ninguém levou a sério, tão pouco o seu idealizador, que profetizou:
-O dia em que ele falar, todo mundo vai ficar perplexo.
 Mesmo concordando, todos nós sabíamos que isso jamais aconteceria e como, de fato, não aconteceu. Só não contava que, passados muitos anos, tal afirmação surtisse efeito.





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