quinta-feira, 21 de maio de 2015

Conto- Pá De Areia

Eric do Vale

Ao flagrá-lo me depreciando, tive vontade de perguntar-lhe: “O que foi que eu te fiz? Por que esta aversão a mim?”. Que eu me lembre, ele jamais me deu um elogio, nem mesmo quando tirava dez na escola. Chegava em casa com o boletim na mão, louco para mostrar-lhe o meu excelente desempenho e ele nem aí. Vez ou outra, ele me parabenizava, mas de uma forma muito seca. Preocupado, eu perguntava:  
-Não está feliz?
-Você não fez mais que a sua obrigação.
Também não me recordo dele ter me dado uma bronca ou encostado a mão em mim. Caso isso acontecesse, eu lhe seria muito grato. Quando adolescente, ascendi um cigarro na presença dele só para chamar a atenção, mas ele nem deu importância.
 Para ele só havia uma pessoa no mundo: mamãe. Quando ela morreu, lembro dele ter dito várias vezes:
-Não é justo! Deus poderia ter levado o meu filho, mas ela não.
Nunca entendi a relação dos dois. Mesmo amando-a, ele fazia das suas: farreava, bebia e arranjava uma outra. Ela ficava sabendo, pois ele nunca fez questão de ser discreto. Mamãe nunca o recriminou e eu terminava servindo de saco de pancadas para os seus recalques dela.
Enquanto ele me tratava com desprezo, ela sempre me criticava, pois nada do que eu fazia a agradava. Quando manifestei o desejo de me tornar médico, mamãe armou um tremendo escarcéu, porque queria que eu seguisse carreira militar ou cursasse Direito e, posteriormente, me tornasse um diplomata ou magistrado. No entanto, nenhuma dessas profissões me agradavam e não havia ninguém que me fizesse desistir do meu sonho, muito menos eles.
Tive muito peito para sair de casa, mesmo ciente de que aquela atitude me custaria muito caro. Banquei os meus estudos com o maior sacrifício até ser recompensado. Apesar dos pesares, fiz questão de que estivessem presentes na minha formatura, mas nenhum dos dois compareceram
Quando mamãe faleceu, procurei reatar o contato com ele e apresentei-lhe a minha esposa, porém a relação era a mesma. A minha ex-mulher ficava abismada com aquilo e me perguntava como eu conseguia nutrir algum sentimento por ele. Acho que somente Freud conseguiria explicar.
Assim que iniciei o namoro com a minha atual esposa, decidimos, ela e eu, promover um jantar no qual estariam presentes os pais dela e ele, é claro. Visto que todos nós já nos conhecíamos de longa data, estávamos certos de que todos aprovariam o nosso namoro.
A minha, até então, namorada, chegou no meu apartamento, poucas horas antes do jantar, dizendo que ele esteve com os pais dela e falou tudo sobre mim.  A priori, pensei: “Puxa, pelo menos ele reconheceu o meu valor! Antes tarde do que nunca”, mas quando ela me contou os fatos concretos, não acreditei. Por que ele fez isso?   Logo ele, que sempre me ignorou e nunca abriu a boca para falar nada, de bom e nem de ruim, a meu respeito!
Naquelas condições, ela e eu saímos para desopilar e fomos a um bar próximo do meu apartamento, quando o avistei conversando com um suposto amigo. Depois do que ocorreu, era obvio que não iriamos chamá-lo para sentar-se conosco. Mesmo assim, fiz questão de ir cumprimentá-lo e assim que me aproximei dele, ouvi a conversa dele:
- Recentemente, meu filho se separou da mulher, sabe por quê?  Porque não tinha capacidade de administrar um casamento. É verdade, ele nunca teve serventia para coisa nenhuma. Acho até que ele não seja médico e é bem capaz dele ter forjado o diploma, mas se for verdade, tenho certeza de que não seja tão competente. Sabe por quê? Porque é um imprestável!
-Por que o senhor não diz isso na minha frente? _ Perguntei de supetão.

Ele quase caiu da cadeira, quando me viu. Sem dizer nada, despediu-se do amigo dele, colocou o dinheiro da conta sobre a mesa e levantou-se. Ele estava tão desnorteado que ao sair do restaurante, nem viu a poça de lama.  




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