sábado, 13 de fevereiro de 2016

Conto- Inconstância

Eric do Vale

Carlos encontrava-se no último ano do curso de medicina e, dentro em breve, noivaria de sua antiga namorada. Depois de ter passado por dois casamentos malsucedidos, Iara, atualmente, dedicava-se exclusivamente ao trabalho de enfermeira, além de esmerar-se na educação de seus dois filhos adolescentes. Por isso, ambos sabiam que era preciso cortar o mal pela raiz.
Não se sabe como e nem quando se conheceram, mas uma coisa era certa: desde o primeiro momento, não se desgrudaram mais. Iara vivia atormentada pela solidão e por isso, o procurava inúmeras vezes, enquanto Carlos encarava aquilo como algo rotineiro. 
Sorte, que vivam em cidades diferentes, mas sempre que podiam, encontravam-se. Carlos, alegando ser escalado para um plantão, ia até a casa de Iara e de lá deslocavam-se para algum bar, cinema, praia e assim, aproveitavam os fins de semana ou feriados até se despedirem e cada um voltar a sua rotina. 
Além dos dois, ninguém mais tinha conhecimento disso. Iara, certa vez, ouviu um comentário de uma amiga sua:
 -Iara, está na hora de você se arranjar.
-Ora, você tem todo o direito de se dar uma chance, Iara. Daqui uns dias, os seus filhos criam asas e você...
Quase que ela abriu o jogo, mas conteve-se.  Carlos também passou por essa provação, quando, depois do plantão, os seus colegas aproveitaram para irem a um barzinho e entre um gole e outro de cerveja, Ivan falou:
-Pessoal, tive de dar um chapéu na patroa para dizer que tenho plantão. Vocês não imaginam como foi difícil. Graças a Deus que ela não é da polícia.
-Sei como é. Ainda bem que a minha mulher está viajando. _ Disse Fernando.
De repente, aquela mesa de bar converteu-se em uma espécie de confessionário misto de divã coletivo, onde todos confidenciavam as suas aventuras amorosas. Carlos foi a exceção, não dizendo uma só palavra sobre a sua vida amorosa, apesar de todos, ali presentes, saberem da devoção dele pela noiva.    
Carlos despediu-se e foi embora.
-Esse Carlos deve ser um otário. _ Disse Ivan.
-Tá na cara que ele é corneado pela noiva, o tempo todo. _Falou Fernando.
Sem dar explicação a ninguém, Carlos foi ao encontro de Iara e a pegou no local de sempre. Antes de irem ao restaurante, ela veio com a mesma ladainha:
-Como eu fui tola em me deixar levar por uma paixão boba!  É preciso terminarmos.
Toda vez que se encontravam, Iara batia nessa mesma tecla dizendo que deveriam colocar um ponto final naquilo.  Carlos, como sempre, concordava e ficava tudo acertado até ela, no dia seguinte, resolver procurá-lo.   Porém, ela insistia:
-Não temos nada a ver, somos muito diferentes.
Ele concordava, mas sabia que tudo voltaria a mesma.
Um Dia, Carlos foi pegar Iara no mesmo local de sempre, quando viu que ela estava acompanhada de uma mulher que, provavelmente, tinha a mesma faixa etária que ele.    Curioso, Carlos quis saber sobre um pouco dela.
-O nome dela é Vitória e ela é noiva, assim como você. _ Falou Iara. Como se estivesse dando-lhe uma cortada.
Carlos procurou saber um pouco mais sobre Vitória e pegou o contato dela no Facebook.  Descobriu que ela estava solteira, ao contrário do que Iara havia lhe dito.  Ele passou a procurá-la e chegaram a sair até que um dia, Iara, por intermédio da própria Vitória, tomou conhecimento disso.
 Iara procurou Carlos e contou-lhe tudo o que sabia e finalizou:
-Não sei onde estava com a cabeça, quando aceitei a me relacionar com você. Há muito tempo que deveríamos ter terminado e sempre digo isso, sempre.   Mas, agora, não tenho mais dúvida: acabou. E te digo mais uma coisa: agradeça a Deus por eu não ter falado nada para sua noiva, pois essa é a vontade que tenho de fazer. Por isso, desapareça da minha vida. Esqueça que eu existe, entendeu?
Carlos foi saindo cabisbaixo por aquela porta, ciente de que tudo havia terminado e com a certeza de que já estava mais do que na hora de colocar um ponto final naquilo. Antes de sair, ele falou:
-Só mais uma coisa...

Aproximou-se dela, olhou-a e deu-lhe um beijo prolongando na boca dela.   

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