domingo, 10 de abril de 2016

Conto- Uma Pedra No Passado

Eric do Vale



“Andei pisando pelas ruas do passado
Criando calo no meu pé caminhador
(Cabelo No Pente: Alceu Valença& Vicente Barreto)

Eu me identifiquei, mas ela não se lembrava de mim e quis saber de onde eu a conhecia. Falei do local que costumávamos frequentar e ela perguntou:
-Quem era você?
Descrevi as minhas características físicas e mesmo assim, ela continuou não se lembrando da minha pessoa. Falei que tínhamos um amigo em comum: Ubiratan.
-Eu conheço, a esposa dele era muito minha amiga. _ Disse ela.
-E então, está lembrada de mim?
-Não.  
Eu não sabia mais o que dizer. Minto, sabia sim. Contudo, achava que não era a ocasião oportuna de lembrar daquilo. Pra quê? Já faz tanto tempo, que, certamente, ela não iria se lembrar. E mesmo que recordasse, não adiantaria de nada: eu, no momento, encontrava-me casado e ela também.
Naquela época, não passávamos de meros adolescentes. Eu a conheci por intermédio do Ubiratan e esse, pelo que sabia, já a namorou, antes. E como ela era solteira, resolvi investir. O Ubiratan já havia me advertido de que ela era muito namoradeira e por isso, tinha que tomar muito cuidado para não me iludir. Quem disse que lhe dei ouvidos? Vendo-a sozinha, caminhei em direção dela e me declarei. Quando fui beijá-la, ela virou o rosto e disse que não.
Voltamos a nos falar, alguns dias depois, e me desculpei dizendo:
-Lamento pelo papelão que fiz.
-Desencana, você não fez nada de extraordinário. É que eu...
Mudei de assunto e dali em diante, ficamos bons amigos.  Conversávamos todos os dias e era comum andarmos de mãos dadas e trocarmos carícias como beijo no rosto e abraços. Mas, um dia, não me lembro bem o que foi que houve e ela quando foi me beijar, mirou bem na minha boca. Foi nesse exato momento que o Ubiratan apareceu e veio conversar conosco. Logo depois que ele foi embora, ela falou:
-O Ubiratan deve ter pensado que eu fosse beijar a sua boca.
-Por que você diz isso?
-A maneira como ele estava olhando para nós dois.
Eu não falei nada e ela continuou:
-Não vejo problema nisso: com o meu último namorado, as minhas amigas davam selinho nele e eu nem me importava.
Aquilo era uma indireta? Ora bolas, foi ela mesma quem não quis nada comigo, portanto não dava para entender.  Aquilo não me saiu da cabeça e quando nos encontramos, conversamos um bocado até que não me contive e encostei os meus lábios nos dela.  
-Você! Eu não esperava. _ Disse ela meio sem jeito.
Ela continuava sem reação e então, sugeri darmos uma volta. Paramos em um local um pouco afastado e resolvi beijar-lhe novamente e ela correspondeu. Depois disso, nunca mais nos vimos e eu não sei dizer o porquê.
Depois do nosso reencontro, perguntei-lhe:
-Você não se lembrou mesmo de mim?
-Não.
Não fazia sentido relatar o que havia acontecido entre nós, no passado. E ela falou:
- Em vez de ficarmos querendo se lembrar do passado, o que me diz de iniciarmos a nossa amizade, nesse exato momento?
-Ótimo.    
E assim, aconteceu.  

         

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